quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Cap. 14: Natal

Passei noites e noites sonhando com minha bicicleta . Linda. Azul. Veloz. Mesmo acordado, sentado na janela, me via do lado de fora pedalando até a banca e pegando o jornal ou até a padaria pegando pão ou refrigerante de uva. Quase não esperei chegar dezembro e logo escrevi uma carta para o Papai Noel pedindo a bicicleta e pedindo desculpas por ter colado as páginas do caderno do Andrade com o Pedrinho na semana anterior.
Mas não me ache tolo. Eu sei que Papai Noel não existe. Mas isso não importa. O importante é a magia do natal (pelo menos foi o que mamãe disse quando entrei no quarto e vi o vovô colocando a barba falsa anos atrás).
Quando chegou na véspera, eu estava ansioso, pois não via sinal algum de bicicleta embaixo da árvore. A não se que tivessem comprado alguma dobrável em vários pedaços. Mas então, vendo minha aflição, papai foi na garagem e trouxe uma linda bicicleta para mim, dizendo que era presente do meu padrinho Tony, que não viria para ceia pois iria para praia com a nova namorada. Na hora não me importei muito com isso, só queria pedalar. Então a verdade apareceu na ceia. Não estava lá o dindo Tony para fazer castelo com a maionese e nem para fazer bolhas no refrigerante comigo. Também não teve um violão acompanhando meu teclado durante o Noite Feliz. E quando acordei não havia ninguém fazendo cócegas nos meus pés.

A bicicleta, então, já não brilhava tanto assim. E eu percebi que o importante do natal não são os presentes. E sim, estar presente.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Cap. 13: Tempo

Esse fim de semana fomos na casa da vovó. Além do bolo outro presente me esperava: um relógio. Ela me disse que eu já era um pequeno homem e o tempo é muito precioso, por isso precisava aprender logo saber usá-lo. Ela me ensinou a ver as horas e os minutos e disse que assim poderia controlar meu tempo.
Mas então cheguei em casa e vi que não tinha aprendido direito. Como poderia controlar o tempo usando um relógio no pulso? Se de fato eu pudesse controlá-lo, eu faria o tempo de ver desenho ser bem maior e o tempo na escola menor. Meus pais chegariam cedo do trabalho e passariam mais tempo dormindo. Assim teriam mais disposição pra brincar no fim de semana comigo. O dia nunca viraria noite e então ficaria jogando bolinha de gude na rua até rapar todas as do Pedrinho. Se eu pudesse controlar o tempo vovô e vovó nunca reclamariam da idade, pois não envelheceriam. E eu jamais cresceria. Talvez as vezes, para ver filmes assustadores. Mas logo depois voltaria o ponteiro do relógio para dormir no colo da minha mãe.
O relógio, descobri depois, só me informa a hora que estou. Quando na verdade eu só quero estar na hora certa. A hora de ser Dudu.

terça-feira, 16 de junho de 2009

Cap. 12: Restaurante

Hoje foi aniversário do Marcos, irmão mais velho do Pedrinho. Como meus pais são padrinhos dele fomos todos comemorar num restaurante bonito de cardápio difícil. Foi minha primeira vez em um restaurante com guardanapo de pano. Não sei se fico feliz ou triste em saber que não voltarei lá até o Marcos passar no vestibular. Também não sei se aquilo foi uma ameaça ou um apoio vindo do pai dele.
Acontece que descobri que o restaurante é como minha janela. Na nossa mesa éramos bem parecidos com aqueles que normalmente almoçam em datas especiais lá em casa. Usávamos as roupas que pareciam mais novas e pratos bonitos, não podíamos ficar descalços e penteamos o cabelo. Ok, mamãe sempre penteia o cabelo e papai quase não o tem, mas hoje meu cabelo estava decididamente mais bonito e arrumado que o normal.
Enquanto fingia comer minha salada comecei a olhar em volta. Reparei em outras crianças que também não eram amigas de agrião e em mulheres que pareciam só comer aquilo. Vi um adolescente fazendo aniversário e os garçons cantarem mais empolgados que as pessoas da mesa. Vi tanta gente diferente, vestidas e comendo de jeito parecido que me fiz perguntas. Por que estamos todos fantasiados? Se vamos comer fora é para nos divertir, então por que não estar a vontade? Será que todo dia é assim? Como os garçons poderiam estar mais animados do que a família se eles fazem isso todos os dias? Talvez a tv estivesse errada: os garçons não são psicólogos, são atores. Sempre sorrindo e agindo como se nos conhecesse.
Tentei imaginar quantas pessoas diferentes mas iguais já estiveram aqui. Quantos meninos que não gostam de agrião já se sentaram no mesmo lugar que eu.
Voltei a olhar para minha mesa. Mamãe estava linda, Papai conversando sobre carnes com o cardápio, Pedrinho misteriosamente já havia comido toda sua salada e Marcos parecia feliz da vida com a viagem que faria com os pais no fim de semana. Restaurante era algo legal. Acho que por que não era comum irmos. E tudo que fazemos em uma data especial vira algo acima do comum. O importante era estarmos juntos e eu não ter que lavar a louça depois de comer. Talvez a maior parte das pessoas que estavam lá estivessem pelo mesmo motivo.
Espero que o Marcos passe logo no vestibular.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Cap. 11: Inverno daqui, inverno de lá

Passou no jornal que hoje seria o dia mais frio do ano. Acho que erraram. Hoje deve ter sido o dia mais frio da minha vida. Ok, eu já pensei isso em outros invernos, mas dessa vez tenho certeza. Desconfiei que até nevaria.
Depois de uma manha cinza e gelada, a tarde abriu um solzinho. Mas foi o suficiente para eu tirar algumas camadas de roupa. Porém quando cheguei em casa tive uma surpresa: a Luzia parecia que usava todas suas roupas de frio ao mesmo tempo. Pensei que ela estivesse doente. Afinal era muito agasalho! Ela então riu da minha preocupação e me deu o apertinho de leve na bochecha, que ela sempre dá quando me comporto bem.
A Luzia então veio com uma história esquisita, que me deixou encucado o resto da tarde. Ela disse que lá da onde ela vem o clima é bem mais quente, por isso um friozinho de nada para mim era o mesmo que um friozão de tudo para ela, pois estamos acostumados à climas diferentes. Eu sei que em lugares muito muito distantes do mundo faz tanto frio que chega a nevar. E em outros lugares tão tão distantes faz tanto calor que até imaginamos coisas. Mas a Luzia é brasileira. Não pensava que ela viesse de tão longe para o clima ser diferente.
O Brasil, então, deve ser uma imensidão. E o mundo? Nossa. O mundo nem sei que palavra usar!

Se eu fosse para o Pólo Sul viraria picolé. Enquanto os pinguins só vestiriam um smoking.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Cap. 10: Trem da vida

Hoje andei de trem pela primeira vez. Cara, foi diferente de tudo o que já tinha feito.
Já andei de bicicleta, carro, patins, ônibus, metrô e ombro do papai. Mas nada se compara ao trem. A primeira vista parece com o metrô, mas depois vi que cabe umas cinco vezes mais pessoas! Ou então, tentam fazer caber.
A primeira coisa que reparei foi que mamãe segurava minha mão mais firme que o normal. Não que eu tenha o hábito de sair de perto dela, mas as vezes as coisas do mundo são tão curiosas que me distraio! Depois percebi que todo mundo parecia ir para o lado oposto do meu. Me perguntei porque ia para frente se estava todos iam da onde eu tinha vindo. Com certeza para onde eu ia não deveria ser tão legal, já que parecia que ninguém queria ficar lá.
Quando estávamos chegando a plataforma pude ver um trem que acabava de chegar abrir as portas. Acho que nunca tinha visto tanta gente no mesmo lugar. Me lembrei daqueles filmes de guerra onde todos os soldados são iguais e vão na mesma direção, seguindo os da frente, sem terem outra opção.
Então finalmente entramos no trem. Vi em minha volta pessoas bem arrumadas. Mulheres de salto alto e unhas bem feitas. Homens de terno e pastas pretas. Vi pessoas com roupas simples, como as usadas pela Luzia no dia de limpar janelas. Vi jovens estudando. Senhoras refletindo. Vi um velho que parecia velho demais para estar lá. Vi uma mãe com um bebê novo demais. Vi grávida de pé. Vi gente vendendo e gente pregando. Eu vi vidas.
A maioria tinha olhos cansados ou indiferentes ao resto do mundo. Mesmo parecendo que havia um mundo inteiro dentro daquele trem. Só eu tinha olhos curiosos. Talvez porque só eu nunca havia estado por lá. Mesmo assim não gostaria de envelhecer com aqueles olhos.
Queria muito poder perguntar à eles: onde vão? Por que vão? Afinal ninguém parecia satisfeito em ir. Nem ansioso em chegar. Talvez impacientes com a demora, mas não agitados com a expectativa de chegar.
Éramos todos sem rosto, pois nunca mais nos veríamos. Era como se não fossemos alguém. Como se a particularidade da vida de cada um não existisse. Por que parecia que os outros não importavam? Por que empurravam? Não empurraríamos nossa mãe. Mas ali ninguém é mãe. Ali ninguém era ninguém. Parecíamos soldados sem nome.
Assim que cheguei em casa, dei nome para cada um dos meus soldadinhos de plástico.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Cap. 09: Escuro

Hoje o Andrade, o chato que senta do meu lado na sala, me chamou de bebezão porque tenho minha luzinha acesa no quarto na hora de dormir. Na hora fiquei triste, porque não sou bebê, mas tenho medo do escuro. Mas depois, enquanto olhava pela janela na hora do jantar, cheguei a conclusão que se eu sou bebê, todo mundo do lado de fora também é!
As pessoas tem medo de andar no escuro. Quando já é noite, todos ficam desconfiados. Olham mais para o lado, com olhos cautelosos. Abraçam forte suas bolsas e nem sorriem para mim. Sempre que ando a noite com mamãe ela me faz apressar o passo. Ela também tem medo de escuro. E olha que na rua nem tem armários.
Não acho que mamãe seja um bebezão. O escuro, afinal, é assustador.
Você não sabe o que tem na sombra, só supõe. É difícil levar a sério o ditado ver para crer. Pois é justamente quando não vemos que imaginamos, supomos.
Talvez não saia no jornal casos de ataques noturnos de monstros do armário como passam notícias de assaltos e acidentes. Mas todo mundo sabe que jornal é sensacionalista e não conta muitas verdades. Bom, pelo menos é o que o papai fala.
Claro que muita gente prefere acreditar que eles não existem, mas também não dá para todo mundo ter luzinha em casa. Mas acredito, que no fundo no fundo, todo mundo tem medo do escuro, mas tem mais medo ainda de parecer um bebezão.
As pessoas preferem fingir que está tudo bem, enquanto correm para a casa com luz acessa.


terça-feira, 19 de maio de 2009

Cap. 08: Amendoim

Amendoim doce é uma das coisas que mais gosto de comer. Por isso, quando ganhei meu cãozinho dei o nome de Amendoim. Antes fingia que meus bichinhos de pelúcia falavam comigo, mas depois não precisei mais, pois além de falar, o Amendoim não falava o que eu queria, falava o que ele pensava. Amigo de verdade faz isso com a gente.
Não acreditava que um cãozinho pudesse ser um amigo tão bom. Afinal vemos tantos cães por aí sem amigos e outras tantas pessoas sem cães. Ele era meu tanto quanto eu era dele. Não me sentia como seu dono, pois dono manda e espera ser obedecido. Eu só esperava ser amado, a medida que também amava.
Brincávamos por horas intermináveis. Não tinha vergonha de chorar na frente dele ou de falar sobre a Nina. Ele era um dos poucos que entendia o medo do escuro.
A tia Lúcia falava para a mamãe que não era saudável uma amizade tão forte com um cão. Ela não entende que para ser amigo não existe pré-requisito. Amizade mesmo não depende do número de patas. Depende da entrega.
Todo mundo deveria ter um amigo. Acredito que não existiria tanto mal se todos tivessem com quem contar.
A solidão enlouquece e nos faz perder as esperanças.
Hoje do Amendoim só me restam as lembranças, saudades e seu pato de borracha roído. Mas ele continua sendo meu amigo. E isso basta por si só.
Saudade de você, meu amigo.

domingo, 10 de maio de 2009

Cap. 07: Dia das Mães

Hoje é dia das mães, apesar da mamãe ser mãe todo dia.
Hoje é o dia que toda mãe merece ser mimada e paparicada. Apesar que muitas mães tenham que trabalhar como todos os outros dias.
Todo ano economizo dinheiro do lanche durante o mês de maio para comprar algo para mamãe. Aí se o que quero dar ultrapassa o valor, papai paga o resto. Apesar que tenho impressão que o presente comprado é só simbolismo. O importante é o presente dado.
Presente comprado é aquele que adquirimos em minutos. Entramos na loja e apontamos. Alguém vem e o embrulha. Damos o dinheiro e nos dão o presente. Não importa o valor, o processo é o mesmo.
Já presente dado é aquele que exige tempo, dedicação e amor. É construído todos os dias e destacado no dia das mães. Cada mãe e filho tem uma relação e forma de demonstrar o sentimento diferente. Não importa o processo, o valor é o mesmo.
Eu sei que as vezes sou terrível. Nos dias que mamãe está brava ela diz em palavras isso para mim. As vezes fala apenas com os olhos. Os olhos das mães são incríveis. São como duas janelas que, quando abertas, transbordam de amor.
Nunca fui mãe e dificilmente serei um dia (apesar que a ciência é meio maluca). Mas imagino que o primeiro olhar que a mãe dá ao seu filho é repleto de amor. O que me faz ficar confuso quando vejo casos na TV sobre crianças órfãs.
Teve um dia, depois de passar a tarde vendo TV, perguntei para mamãe o que ela faria se ela e o papai perdessem o emprego. Ela disse que procurariam outro e no meio tempo dariam um jeito de sustentar a gente. Foi um alívio quando ela não citou a possibilidade de me abandonar. Porém não me dei por satisfeito e perguntei se ela me abandonaria caso a gente ficasse muito pobre ou se eu aprontasse demais. Ela então abriu aquele sorriso de mãe, que cura mais que mertiolate. Disse que independentemente do que acontecesse ela sempre me amaria. E como mamãe não mente, acreditei nela.
Será então que algumas mães fingem que não amam? Ou será que mesmo amando são obrigadas a fingir não amar? Eu sei que existem mães que se mostram indiferentes. Mas será que elas não amam, mesmo assim?
Acho que a única forma de não se amar alguém que veio de você é não amando a si mesmo.
Do mesmo jeito que acho que as vezes se tem tanto amor no coração, que amam filhos que não são de sangue, só de coração. Não é preciso ter filhos para ser, de fato, mãe.
Hoje, mais que nos outros dias, desejo que todos encontrem o amor de mãe em alguém.

sábado, 9 de maio de 2009

Cap. 06: Chuva

Estava brincando com o Pedrinho e suas bolinhas de gude no quintal, até que começou a chover. O Pedrinho saiu correndo para dentro de casa, abandonando o jogo mesmo estando ganhando. Mas eu continuei onde estava. Olhei para cima e vi além do céu cinza. Vi o infinito. Afinal de onde mais poderia vir a chuva?
Um sorriso brotou em meu rosto, mas durou muito pouco. Mamãe ralhou comigo para que entrasse e não ficasse doente. Não entendo. O chuveiro é uma mini chuva e ela me obriga a tomar banho todos os dias! Mesmo assim entrei, não queria correr o risco de ficar sem sobremesa.
Me pus a olhar o lado de fora, com inveja daqueles que estavam na chuva. Me surpreendi ao ver que nenhum deles parecia gostar estar do lado de fora. Pareciam todos zangados e apressados, principalmente a moça bem vestida de pasta na cabeça. Parece que ninguém vê o milagre.

A chuva para mim é um milagre. Um presente. A chuva faz as flores do jardim abrirem para mamãe sorrir. A chuva faz a vida viver.
Não sei o que faz a chuva acontecer. Talvez seja o céu chorando. Talvez seja o Papai nos regando. Talvez a chance da gente florescer.

Me pergunto se em meio as lágrimas que veem do céu não está misturada a saudade daqueles que agora moram por lá. Me pergunto se as lágrimas dos que aqui sentem saudade também encontram uma forma de chegar por lá.

A chuva para mim também é sinônimo de saudade.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Cap. 05: Macacos

Acho macaco uma coisa danada de legal. Hoje aprendi na aula de ciências que os humanos vieram dos macacos. Mas vovó já tinha me ensinado que somos todos descendentes de Adão e Eva. Cheguei a conclusão que Adão e Eva eram macacos, e devido as suas macacadas foram expulsos do Paraíso. Afinal, Deus disse para não comer maçã, assim como mamãe me fala para não pegar biscoito do pote azul. No fim, nós três ficamos de castigo.
Os macacos são mega presentes em nossas vidas. Mamãe sempre me chama de macaquinho quando me penduro nos móveis.
Quando perguntei para o papai porque ele não era astronauta ele me disse cada macaco no seu galho! O vovô quando fica abismado diz macacos me mordam! Já mamãe, que acha que não sei que ela fala palavras feias também, sempre usa expressões alternativas, como quando manda alguém pentear macaco. Por fim, vovó é uma típica macaca velha, cheia de manias.
Viu só? Uma macacada só! Isso sem contar os micos!

Não sei dizer quantos tipos de homens existem. Macaco tem de todo tipo. Assim como o homem. Tem gorila, mau e forte. Tem mico-leão-dourado, bonito e raro.
Tem macaco que protege sua família a todo custo. Tem homem que haja assim também. Tem violento, que mata macaco menor e indefeso. Tem homem que mata homem também.
Acho que macaco age assim para sobreviver. E o homem?
Macaco é macaco, gente é gente.
Mas as vezes me pergunto quem é o animal.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Cap. 04: Sonho

Existem dois tipos de sonho. o sonho dormido e o sonho acordado.
Ambos são inevitáveis e geram certos problemas e prazeres.

O sonho dormido é sempre imprevisível. Ele pode ser bom como pode ser ruim. Eu raramente tenho sonho ruim, mas quando tenho me escondo na cama dos meus pais, onde tudo que é ruim não pode me alcançar. Tem gente que nunca tem sonho ruim. Pois não veem filmes feios (nem mesmo escondido) e tem uma luzinha que espanta todo o mal.
Mas papai me disse que tem gente que tem mais sonho mau que sonho bom, pois tem a consciência pesada. Ainda não sei bem o que é consciência (tanto que para escrever tive que procurar no dicionário), mas sei que se não fazemos nada errado não temos que nos preocupar com ela.
O grande problema do sonho dormido é que mamãe sempre o interrompe na melhor parte pela manhã, e por mais que eu me esforce pra voltar pra ele, nem mamãe deixa e nem minha lembrança permite. Ele escapa e me faz suspirar antes de levantar da cama.

O sonho acordado acontece quando menos se espera. As vezes me chamam de distraído, mas é injusto. Só estou concentrado no meu sonho acordado. Mamãe e Papai me disseram ontem, depois de lerem o recado da minha professora, que eu devo deixar os sonhos só para hora de dormir. Que quando estou acordado, e principalmente na escola, tenho que pensar na vida real, não em devaneios.

Mas ora, que sentido tem a vida real sem os sonhos?
Um cavalo é só um bicho bobo de quatro patas, maior que o meu querido Amendoim e mais chato que o leão. Mas se eu imaginá-lo com asas, me torno o Hércules ao montá-lo. Por que então está errado descrever o cavalo com asas na aula de ciências?
Os sonhos dão as cores no meu mundo. E sem eles não a mistério na hora de dormir e não há mistérios para quando eu acordar.

Espero nunca parar de sonhar.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Cap. 03: B A BÁ

Aprender a escrever é coisa de outro mundo. Duvido que existam muitas outras experiências tão fantásticas quanto essa.
Tenho amigos que acham que escrever é como falar. Mas eu discordo totalmente. Nem toda palavra tem significado muito profundo. E têm algumas que de tão profundas, não entendo o significado.
As palavras têm muito poder. E para cada um significa uma coisa. Aprendi isso com papai, quando via televisão e ele disse que a fome do menino pobre do jornal não era como a minha fome esperando o jantar. Se cair na prova o que é fome, não sei se saberei responder.
Mas sei o que é perda, porque ano passado perdi meu melhor amigo, o Amendoim, meu cãozinho. E perda, nesse caso, não tem nada a ver com quando eu não acho o tênis de manhã.

Outra coisa cabeluda é o verbo.
Tem palavra que fala de passado mas não se conjuga! Como saudade. Como lembrança.
Tem palavra que fala de futuro e também não muda! Como esperança.
Mas essa, as vezes se perde.

Mesmo tendo tantas palavras no mundo ( e de acordo com meu professor eu nunca saberei todas elas), tenho a impressão que as vezes algumas faltam serem inventadas.
Como o que sinto pela Nina, da carteira da frente do Pedrinho, do lado do Andrade, que está do meu lado na sala.
Ah... não pensem que é amor! Amor é o que meus pais sentem um pelo outro e eu não quero ter filhos com ela! Só queria saber se ela quer lanchar comigo.
Há palavra para isso?

O mundo das letrinhas é infinito. Podemos não ter muitas delas, mas suas combinações? Nossa! Nunca tinha pensado em como coisas grandiosas podem ficar resumidas em letras! Imagine!
Por exemplo, GUERRA. Como o Inventor das Palavras pode ter feito GUERRA maior que AMOR?! Maior que ?!

Que mundo confuso!
Que mundo fantástico!
E é só o começo.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Cap. 02: Janela

Um dos meus lugares favoritos é a janela. Ela é a abertura entre dois mundos: de dentro e o de fora. Quando sento no peitoril me sinto capaz de estar em dois lugares diferentes ao mesmo tempo.

O lado de dentro é rotina. É quente e familiar. Só tem mudanças em feriados importantes, como o natal, porque comemos comida mais gostosa que o normal e ganhamos presentes. Apesar que aprendi, do lado de dentro da escola, que natal é celebração do nascimento do menino Jesus. Nunca ouço falar dele aqui dentro no natal.
Do lado de dentro vejo televisão, que retrata o lado de fora. Porém não o lado de fora da minha janela. Nada retrata esse lado de fora a não ser minha janela.
Minha vizinha não passa na TV. Mas o que passa na TV dela passa na minha.
Zilhões de pessoas veem Big Brother, que é a novela da vida do lado de fora. Mas nenhuma delas já viu um Big Brother pela janela.

Do lado de fora também há rotina. Tem coisas que sempre acontecem. O lixeiro passa, assim como o carteiro. As crianças vão cedo para a escola e voltam para o almoço. Tem coisas que só acontecem quando estou olhando. Passam pessoas que sempre vi e pessoas que nunca vi. Não conheço nenhuma delas. Algumas sorriem para mim, por eu ser criança. Outras parecem que nem sabem mais sorrir.

Daqui, do lado de dentro, imagino o que aqueles, do lado de fora, estão pensando e para onde estão indo. Eu aqui, preso nesse pequeno lado de dentro. E eles, na imensidão do lado de fora. Mas serão eles igualmente presos?
Talvez eu os pergunte um dia.


Ei, psiu!
Você é prisioneiro do seu lado?

lado de dentro
lado de fora

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Cap. 01 : Oi! Meu nome é Dudu!

Meu nome é Dudu. Simples assim. Nada de Edu, ou Eduardo. Muito menos Gracinha, Cute cute da mamãe ou Moleque. Só Dudu.
Tenho uma idade indefinida. Sou velho demais para achar que tudo é possível. E novo demais para acreditar no impossível. Acredito, então, no duvidoso.
Não sou pobre, e muito menos rico. Prefiro não ter o dinheiro como definidor de qualquer coisa. No meu mundo o dinheiro não quer dizer muita coisa. É uma pena quando quer dizer na vida de outras crianças.
Meus olhos são caleidoscópicos.
Meu pés possuem asas.
Minha imaginação é infinita.
E meu nome, é simplesmente Dudu.
 
BlogBlogs.Com.Br